top of page
  • Foto do escritorJonas Silva

Circuito dos Cinco Lagos e Pedra do Sino de Itatiaia - Parque Nacional de Itatiaia

Esperávamos fazer um dia tranquilo de caminhada terminando antes das 16h. Foi com essa expectativa, que acordamos um pouco mais tarde, para tomar o café somente 07:00. Durante o café encontramos um grupo que estava começando a Travessia Rancho Caído, eles haviam esquecido o coador, salvei o dia emprestando o nosso.

O grupo estava acompanhado de um guia. Carregavam duas garrafas de vinho em três pessoas. Definitivamente as pessoas estão fazendo as coisas do jeito errado. Pior ainda, o rapaz do trio transferiu a bebida para garrafas plásticas, talvez com medo de quebrar o vidro, e porcamente largou as vazias em cima da mesa do quiosque. Não se acreditando que uma mágica da natureza vai fazer com que a garrafa milagrosamente suma, dos males o menor, provavelmente teria largado as garrafas no acampamento se tivesse levado. Eu deveria ter falado alguma coisa, mas, abstive-me. De certo modo também estou errado. Antes de começar a trilha peguei as garrafas e coloquei na lixeira de trás do quiosque.

Preparamos a mochila para o hikking day, e começamos a trilha às 08:40. Quase no mesmo horário que o grupo começava a Travessia. A trilha segue o mesmo caminho para o Agulhas Negras, com o Maciço das Prateleiras à direita e o Morro do urubu à esquerda. Ultrapassamos o trio antes da ponte pênsil, já na bifurcação para o Agulhas.

Após a ponte, uns 300 m, a trilha bifurca no sentido Asa de Hermes e Pedra do Altar. Entramos nessa última. Contornando o Morro do Urubu numa subida longa. Ainda não se recuperamos do dia anterior e a cada meia hora fazíamos uma pausa, nesses intervalos contemplávamos o Agulhas, que começava a ficar salpicado de pontinhos coloridos percorrendo a trilha e na direção do Prateleiras os primeiros lagos são visíveis. Na cela entre a Pedra do Altar e Morro do Urubu continuamos e saímos da trilha do Altar descendo o vale.

Primeiros lagos do circuito a partir do Abrigo Rebouças

Quando a trilha faz a curva para a direita temos à frente mais um lago, devido a distância que ficamos dele, parece bem maior que os anteriores. É curioso como um local a mais de 2300 m de altitude, cercado por vales profundos, consegue armazenar água e em uma época seca; o inverno.

Já dentro do vale margeamos o lago cruzando em frente à Pedra do Altar. Nesse trecho ouvi um piado alto, parei e escutei novamente, vinha do Morro do Urubu. Observando com calma vi algo diferente no de uma das pedras. Mirei a câmera com a telefoto e pudemos identificar um Gavião Real, foi um momento mágico. Só não conseguis fotos nítidas devido a distância e falta do tripé. Esse último, aliás, estava conosco, mas, esqueci o suporte da câmera.

Empolgados com a surpresa tocamos para a frente subindo um passo de montanha, onde fica a bifurcação da trilha normal dos Cinco Lagos. Paramos mais uma vez antes de começar a descida para o Vale do Aiuruoca. A trilha que já era boa, ampla e regular, fica melhor ainda. A manutenção foi recente, as poucas pedras foram tiradas do caminho e a trilha foi roçada com dois metros de largura.

Quando entramos pelo vale algumas nuvens baixas começaram a entrar no vale e encobrir os cumes. A imensidão do vale de tons quase monocromáticos, a sombra das nuvens e seus bailar com os ventos dá um charme especial ao ambiente. Difícil não se emocionar com tanta magia, até a pequena discussão quanto ao ritmo de caminhada, que iniciamos mais cedo ficou de lado.

Vale do Aiuruoca

Contornamos pela encosta do vale esperançosos de ter uma janela de tempo aberto no cume da Pedra do Sino de Itatiaia. À nossa direita a Pedra do Altar, o Maciço da Agulhas Negras, a Pedra do Sino de Itatiaia e à frente a Pedra do Ovos de Galinha, precisamos marcar ponto nela antes de atacar a Pedra do Sino. No meio do vale o Rio Aiuruoca, de água cristalina e gélida, corre entre as touças de capim e as pedras. Paramos para recompor as garrafas e descansar. Foi nessa hora que tirei meu gorro, o cabelo parecia uma juba de leão. Até um casal que vinha logo atrás ficou assustado ao ver a situação do indivíduo.

Depois de contornar a Pedra do Ovos de Galinha pegamos a trilha do meio na bifurcação Pedra do Sino, Rancho Caído, Ovos de Galinha. Passando pelo charco tomado de caratuvas, iniciamos uma subida por uma rampa extensa de 60°. Nessa rocha a trilha segue dezenas totens montados pelos trekkers ao longo da rota.

Rochas caprichosamente apoiadas

Começamos a observar pelo caminho enormes rochas caprichosamente apoiadas em frágeis pedestais, temos a impressão que a qualquer momento vão rolar por cima da gente. É como se alguém houvesse equilibrados elas naqueles pontos. O chão parece um solo lunar. Milhares de crateras pequenas e canaletas são curiosamente dispostas, eu imagino que tenha, se formado depois do derramamento do magma com as bolhas de ar, que se desprendiam da lava.

Contornando o cume pela direita, passamos para outra rampa cheia de veios como calhas, parecidos com o encontrado nas paredes do Agulhas Negras. Esse trecho foi fácil de superar. Chegamos ao cume às 11:40. As nuvens iam e vinham dando aspecto único ao vale, aos dois vales. O primeiro do lado Aiuruoca e o segundo entre o Agulhas Negras e o Pico da Maromba, o Vale do Rio Preto. Por instantes o pico ficava descoberto, em outros era envolvido pelo branco. Por cima o sol atravessava as nuvens ardendo na pele, quando não era o sol, era o vento que castigava. Em uma das janelas pudemos ver o trio da Travessia parando na base da Pedra dos Ovos de Galinha para almoçar. Isso despertou nosso apetite e aproveitamos para fazer um lanche antes de voltar.

Cume Pedra do Sino de Itatiaia

A descida foi rápida e às 13:20 já estávamos na trilha da Cachoeira do Aiuruoca, no meio do vale de mesma denominação. A Cachoeira fica a uns 150 m da trilha da Pedra do Sino de Itatiaia. Possui águas cristalinas e seu volume baixo forma um véu de uns 20 m de altura. A água pulveriza e forma um arco-íris na base, sob uma piscina natural de águas frias. Para descer na base peguei a trilha do lado direito, curta mas muito íngreme. Lá embaixo vi o arco-íris e pude comtemplar a queda, na parte de cima nó chegamos na cabeceira da cachoeira e não vemos nada além de um vale.

Cachoeira do Aiuruoca

Retomamos a trilha, já conhecida. As nuvens haviam dispersado deixando o vale todo iluminado pelo sol. Dessa vez viramos à direita no passo, pegando a trilha do Circuito Cinco Lagos. Essa trilha começa a contornar um morro, por uma grande parede de pedra inclinada, numa trilha que exige muito dos tornozelos. Logo no início ficamos em dúvida se seria ali mesmo a continuação e só sentimos confiança quando começamos a encontrar, além dos totens, pequenos marcos de madeira com a ponta pintada de vermelho.

A laje complicada se estende por cerca de um quilômetro, até entrar de novo no trecho bem demarcado e roçado. Olhando a frente vimos uma grande elevação, ficamos contentes imaginando ser o Morro do Massena, nossa última subida antes de descer para a estradinha do abrigo. Antes de começar a subir a trilha contorna para à direita descendo ainda mais no vale. Pensamos que ela contornaria para depois subir, mera ilusão. Saímos outra vez numa laje inclinada marcada apenas por totens e marcos. Para desespero, descíamos cada vez mais.

Laje do Circuito Cinco Lagos

Já estávamos a uma hora caminhando encosta a baixo, com os tornozelos ardendo, o dedinho do pé parece que tinha sido amassado por um caminhão. E nada do fim. Já sem esperança, às 15:00 enxergamos o que parecia ser o fundo do vale. Do outro lado, mais ou menos um quilômetro, vimos a roçada que indica a sequência da trilha.

Passamos no fim do vale onde uma placa indicava "Cachoeira dos Cinco Lagos", o volume de água era tão pequeno que se resumia a uma rocha molhada. Uns 300 m depois tinha uma piscina de pedras com água pura, incrivelmente limpa. Sentamos para descansar as pernas e apreciar a imensidão que nos envolvia. De todos os lados picos de mais de 100 m nos rodeavam, nem vento faz nesse buraco. A paz reina em absoluto, apenas o som das águas correndo e alguns pássaros gorjeando melodias animadas.

Recomeçamos a trilha pela roçada e depois de contornar mais uma colina encontramos o último lago, lá no fundo do vale, entre as touças de capim. Vamos nó descer mais uma vez, já nem damos importância mais se é descida ou subida, vamos tocar para frente. Passamos na lateral do lago, podendo ver quão limpas são suas águas. O cenário pintado de plano de fundo é maravilhoso, o Maciço das Agulhas Negras tem aqui um dos seus melhores ângulos, ademais o capricho com que as nuvens se dispões no céu é inacreditável. Mesmo cansado parei por 20 min admirar sentado em uma pedra.

Último lago com Agulhas Negras no plano de fundo

Finalmente a trilha começa a circular o Morro do Massena pela direita. Nessa parte da caminhada a Serra Fina e a estradinha da Garganta do Registro dão o retoque final. Em uma das nossas paradas de admiração ouvi grunhidos no morro do outro lado, por mais que tentei não consegui identificar o autor, provavelmente um lobo-guará, mas, não foi dessa vez que vi ele de dia.

Amém, foi a palavra que queria gritar quando vi lá embaixo a estradinha do abrigo. Antes precisamos descer mais um trecho, dessa vez com prazer. Saímos na estada já passadas dezesseis horas. Essa estrada, que pela primeira vez estamos percorrendo com visual do parque, no domingo ela estava tomada pelas nuvens e ontem passamos nela à noite, percorre 2,5 km passando pela nascente do Rio Campo Belo. Durante todo o percurso tem visual característico das Agulhas Negras vigiado de perto pelo Morro do Couto à sua direita.

Chegamos no acampamento às 16:45, a tempo de ver o Agulhas Negras, mais uma vez ser colorido de vermelho pelo pôr do sol. Já percebemos essas cores na segunda e terça-feira, no entanto, não tinha fotografado essa maravilha ainda. Sentei ao lado da barraca esperando os últimos raios de sol, que ao serem difundidos pelas nuvens altas, se não houver nuvem cobrindo o cume, dá a ele um tom amarelado que vai se enrubescendo até ficar vermelho e depois quase marrom ates de voltar ao cinza comum. É um espetáculo particular que todos deveriam experimentar. Basta sentar de frente para o maciço e esperar. Esperar? Coisa muito difícil hoje em dia, não?, não para quem vive uma harmonia com a natureza.

Cores avermelhadas no Agulhas Negras

Só então fui tomar um gélido banho, amenizar o problema da juba no cabelo para depois encher a barriga de arroz com sardinha e claro, café: há o café! Nos recolhemos logo, descansar o corpo para na sexta-feira iniciar o retorno pela Travessia Rancho Caído.

 

Este diário é o oitavo de uma sequência de dez dias acampados no Parque Nacional do Itatiaia na divisa entre os estados de Minas Gerais e do Rio de Janeiro. Os demais dias, parte baixa e parte alta são relatados nos diários antecedentes/subsequentes.

47 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page